A militância de esquerda está perplexa, cada vez
mais distante do clamor popular, e corre o risco de ser engolida pela direita
reacionária e golpista.
*Por Ciro Gomes — publicado 04/08/2013,
em www.cartacapital.com.br
Ao pensar em nossos desafios presentes e futuros,
tento entender as perplexidades que fizeram, em pouco mais de uma década, nossa
militância progressista e de esquerda deixar de ser estilingue, baladeira para
os cearenses, e tornar-se vitrine. O moralismo de goela, é indisfarçável,
virou-se contra seus apologistas e desde o assim chamado “mensalão” o grosso da
militância de esquerda apanha no canto do ringue com a denúncia multifacetada
da corrupção, para ficar no exemplo mais malcheiroso.
Não é só isso. Valores como ordem, segurança
pública, austeridade fiscal e comportamental, eficiência, juntam-se à
moralidade como temas que foram ou têm sido usurpados pela direita reacionária,
sem que a nossa militância de esquerda reaja ou até mesmo se dê conta. Na verdade,
ainda estamos sob a influência de uma geração que viu esses valores serem
agitados pelo pensamento golpista, quando não truculento, para justificar a
ruptura da ordem democrática e do Estado de direito e as violações chocantes
das mínimas liberdades e franquias inerentes ao ser humano. Compreende-se,
portanto. Não se justifica mais, entretanto, sob pena de desertarmos da agenda
popular e cairmos de novo no equívoco de transferir valores universais e
progressistas à militância reacionária. Pior, sob pena de pautarmos nossa
prática pela forma vesga com que o mundo conservador interpreta esses valores
como creio, comovidamente, que fazemos hoje.
Tomemos a forma com que, perplexa e
atabalhoadamente, boa parte de nossas autoridades reagiu à violência física de
pequenos grupos protofascistas infiltrados nas manifestações populares. Uma
forçada tolerância, uma inibição desrespeitosa da polícia, um descumprimento
generalizado da lei que, ao lado de garantir plena liberdade de manifestação,
garante também o direito de ir e vir nas vias públicas, a incolumidade de seus
patrimônios públicos ou privados, a inviolabilidade do domicílio, mesmo que
seja de um político impopular, a eleição de prioridades por aqueles que têm
legitimidade para tanto controladas pelas instituições da democracia. Crimes de
ação pública cometidos à frente das câmeras de tevê, em vez de resultarem no
devido procedimento legal, trazem integrantes politiqueiros, felizmente ínfima
minoria, do Ministério Público à ribalta com um discurso de demagogia pura,
enquanto pequenos comerciantes choram impotentes a destruição de suas lojas e
ao assalto de suas mercadorias.
Daqui a pouco, e em meio às manifestações já
surgiram os primeiros cartazes, o povo começará a chamar de volta os militares.
Ou nossa demagogia revogará a história para desconhecer as imensas
manifestações populares que antecederam 1964 sob o jargão da Marcha com Deus e
a Liberdade? Estamos muito longe disso, claro, mas minha reflexão é sobre
valores. E esses só se afirmam na militância permanente e no exemplo.
Ao transpor essa mesma inquietação para a
administração pública, de novo encontramos a perplexidade a nos colocar cada
vez mais distantes do clamor popular. Ao lado da saúde, o desejo generalizado
da família brasileira em toda parte é uma resposta à explosão relativamente
recente dos indicadores de violência, especialmente dos assaltos à mão armada e
dos homicídios. Incrível. Não há uma única iniciativa institucional ou
administrativa que guarde a mais remota coerência ou proporção com a agenda do
medo que se dissemina pelo País afora. No nosso vácuo, ideias toscas ganham
popularidade imensa. A redução da maioridade penal ou a pena de morte são as
respostas da reação. E as nossas?
Na economia não é diferente. Ao contrário, aqui se
pratica o crime perfeito. Ou a tentativa dele. O mundo reacionário colocou a
esquerda quase toda na defensa e prática de seu modo de interpretar o
equilíbrio fiscal, austeridade monetária e integração internacional. Aqui a
tragédia cobrará um preço histórico. O atual e inexplicável aumento de meio
ponto porcentual na taxa de juros gera uma excedente no gasto corrente do País
de cerca de 8 bilhões de reais por ano.
Valores... Coordenação estratégica do governo,
iniciativa privada e academia para executar um projeto pactuado de
desenvolvimento. Substituição de importações, compras governamentais,
desenvolvimento regional, legislação antitruste, crítica aos atuais marcos de
propriedade intelectual e remessa de lucros... Heresia pura?
Sinceramente, a esquerda acha que toda oposição a ela é direita e corrupta. Para a esquerda não há mais jeito, estão a 10 anos no governo e não fizeram 1% para resolver os gargalos de nossa infra estrutura. Mas bem esperado da revista ''oficial'' do governo(vulgo Carta CaPTal) e do seu aliado Ciro Gomes.
ResponderExcluirE os 500 anos anteriores da direita? Com tanto tempo no poder acho que dava para ter resolvido, neh? Comparar 10 anos no poder com 500 anos, no mínimo, é intelectualmente pobre!
ResponderExcluirPelo visto o seu comentário que é intelectualmente pobre. Eu escrevi "a esquerda acha que toda oposição a ela é direita e corrupta"... ou seja a esquerda acha que qualquer oposição a ela trata-se dos tals 500 anos que você falou. Errei no comentário por me referir a esquerda e não ao PT. Até por que eu mesmo me considero ideologicamente de centro-esquerda. E sim, o PT não resolveu mesmo, e não teve tempo para isso, mas teve demonstração clara de que é mais do mesmo(ou esqueceu da aliança com o partido mais conservador do país o "PMDB" e o PP de Maluf) e dá mostras que mesmo se ficar 1000 anos no poder não vai resolver os gargalos do país.
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