ALÉM DA LUPA - A IMPORTÂNCIA DA ÁGUA NO PLANO DE EDUCAÇÂO AMBIENTAL

  Por Benedito Ferreira Marques

A IMPORTÂNCIA DA ÁGUA NO PLANO DE EDUCAÇÂO AMBIENTAL

Ao ter acesso ao Plano Estadual de Educação Ambiental do Maranhão, fui tomado por incontida alegria e irrefreável entusiasmo, sentimentos que se misturaram com um elevado grau de ufanismo. Percebi que o meu querido Maranhão - de tantas glórias e conquistas e de tantas tradições e vultos no cenário nacional, no campo da literatura, da cultura, das artes e de tradições realçadas a todo tempo -, também passou a pontificar no campo das ciências sociais, do desenvolvimento econômico planejado, enfim, aderiu à modernidade sem abrir mão do passado. Já não pode ser tachado de pária no contexto socioambiental brasileiro, abraçando, sem a timidez subalterna, a causa mais humanizada de todas, que se resume num desafio de todos quantos habitam o Planeta TERRA: salvá-la.

De logo, chamou-me à atenção o que foi posto no frontispício da Apresentação do auspicioso Plano:

     “Nem as leis, nem as taxas obrigam os cidadãos a respeitarem o meio ambiente, se esse respeito espontâneo não lhes for inculcado pela educação” (Jacques Vernier)

Se essa afirmação de conteúdo marcadamente categórico não alvejar consciências adormecidas ou indiferentes, o arsenal legislativo condensado no sistema jurídico brasileiro não passará de um arcabouço legal inútil, a atingir até mesmo a justificativa do Estado Democrático do Direito, que densifica a principal Lei do País: a Constituição Federal. A esse respeito, tenho dito e repetido neste espaço franqueado, que a ordem jurídica somente se explica e se justifica se for assimilada em seu sentido teleológico e observada em seus princípios fundantes, principalmente pelos aplicadores das leis. A assimilação voluntária traz o respeito em seu bojo; a submissão aos ditames justifica o sentido da norma escrita. Para que servem as regras estabelecidas, se o seu descumprimento as conduz à inocuidade? A ordem democrática pressupõe a observância à ordem jurídica. Sem essa simetria calculada, não se pode falar em “sociedade organizada”. Louvo, portanto, o que se antepôs à Apresentação do Plano.

            Com a mesma intensidade do primeiro impacto, também me agradou, em particular, a Temática 2, sob a rubrica Educação Ambiental como Apoio à Conservação dos Recursos Hídricos. Agradou-me não apenas por eu ter explorado essa temática no meu projeto de pesquisa no doutorado, que culminou com a defesa da minha tese, na Universidade Federal de Pernambuco (2004), abordando a natureza jurídica da outorga de direitos de uso dos recursos hídricos, mas também porque a minha terra-berço (Buriti-Maranhão) ostenta um cenário dramático no setor, a partir de córregos que banham a sede, além dos graves problemas na zona rural, em razão do desmatamento desenfreado para extensos campos de soja. A devastação que se operou em nosso bioma comprometeu até mesmo as nascentes de sustentação de importantes mananciais, como ocorre com o Rio Preto nos arredores da sede do Município, só para ficar num exemplo. Não sem razão, a comunidade daquela região vem desenvolvendo uma campanha meritória, sob a liderança da Professora Delva e do Prof. Jairo, Diretor da UE Joaquim Luis Alves de Sousa, no povoado Areia dos Brancos. A convite, lá esteve o Prof. Aliandro Borges, ocasião em que proferiu uma palestra sobre a Educação Ambiental. Iniciativas como essas devem ser reproduzidas em outros estabelecimentos de ensino e em comunidades organizadas, porque enriquecem e fortalecem os propósitos salutares da Campanha pela Educação Ambiental, deflagrada em Buriti (MA), no dia 27.6.2023.

  Também aplaudo a pertinente colocação no Programa, segundo a qual “a gestão sustentável de águas para ser implementada com êxito depende de uma Educação Ambiental contínua, permanente, que integre os seres humanos à natureza”. E mais que isso, a Lei estadual n°9.279/2010 – que institui a Política Estadual de Educação Ambiental do Maranhão -, confere ao Plano Estadual de Educação Ambiental o comando normativo principal, no qual pontifica a observância transversal de todas as políticas estaduais, nas quais devem ser concretizados os objetivos traçados, sob obediência às diretrizes, estratégias, metas, recursos e prazos para a implementação da almejada Política.

  Em minha compreensão, o principal ponto que destaco nesse Plano é a transversalidade estabelecida, porque abarca todos os órgãos da esfera estadual e, por tabela, potencializa o comprometimento dos órgãos municipais em suas políticas nesse setor.

  É evidente que um Plano dessa envergadura não vai depender apenas dos organismos governamentais, porque a participação da sociedade é imprescindível, até porque as ações projetadas centralizam como principal objetivo a educação ambiental. A educação já é um dever do Estado e um direito dos cidadãos, e se esse direito-dever envolve o meio ambiente, a corresponsabilidade é mandamento constitucional, conforme já salientei em outro texto nesta coluna.

  Operador do Direito – como advogado e professor em cursos jurídicos por mais de três décadas -, conheço os percalços e as dificuldades que permeiam os mecanismos para a aplicação das leis. Mas também sei que o vetusto princípio que já realcei neste espaço, “a todo direito corresponde uma ação que o assegura” anima e reanima perseguir a efetivação do sistema legal posto. Diante dessa parêmia, torna-se inadmissível que a inércia consciente justifique a omissão e o medo, em detrimento dos recursos naturais de que depende a própria vida. Não se pode banalizar o brocardo, segundo o qual “a água é vida”, como discurso vazio e meramente retórico. Recordo-me de ter ouvido, certa feita, um vaqueiro – com a sua linguagem simples e sotaque peculiar -, dizer-me: “A água é o sangue da terra; se “fartá”, morre a terra, morre tudo”. Ele defendia junto ao fazendeiro o aproveitamento de uma nascente para alimentar mais um açude em média propriedade rural, onde cuidava de menos de 50 cabeças de gado vacum. Concluí que a metáfora do “sangue da terra” não era desprezível, porque, realmente, não há vida sem água, nem para a flora e para a fauna, nem para a humanidade. Nenhum ecossistema sobrevive sem os recursos hídricos. E, se esse “sangue da terra” está comprometido com a poluição, por desinformação ou mesmo por intenção criminosa, a educação ambiental é um dos remédios.  Parodiando o sertanejo: “se “fartar” água na terra, morre tudo por enfarto”.

  A campanha que se desenvolve em minha terra, desde o dia 27.6.2023, não é uma simples campanha. A sua dimensão é tão relevante, que não seria exagero qualificá-la como “movimento”; movimento que induz uma grande marcha, uma caminhada permanente, envolvendo toda a população buritiense, da sede e da zona rural.  O “Movimento pró-Educação Ambiental” não se resume apenas a aprendizados teóricos, à compreensão de terminologias técnicas, à interpretação de normas e análises de texto.  A educação vai além desses limites, porque envolve sensibilização e conscientização, que são valores de conteúdo subjetivo.

  Quando se diz que não bastam “leis e taxas”, o que se quer dizer é que estas são abstratas e, quando se confrontam com fatos concretos, deve ser buscada a efetividade da ordem legal, ainda que se enfrentem os escapes - também institucionais, ressalvo -, como ocorre com as chamadas “prescrições intercorrentes” em processos instaurados por crimes notórios. É preciso entender que, se esses crimes são de natureza ambiental, a Justiça poderá ser  tardia, porque a vítima é a própria natureza e, com ela, a vida humana.

  A educação ambiental, portanto, tem a virtude de viabilizar um dos mais sagrados princípios da Ciência Ambiental: a PREVENÇÃO. E, por isso mesmo, proclamo minha adesão a esse movimento cívico, e o faço por convicção amadurecida, em estudos avançados. Para mim, ÁGUA É DIREITO DE TODOS; SUSTENTÁ-LA É DEVER DE CADA UM.

 SOBRE O AUTOR

- Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Maranhão (1967); cursos de Especializações (Direito Civil – Direito Agrário e Direito Comercial) e Mestrado em Direito Agrário, todos pela Universidade Federal de Goiás; Doutorado em Direito, pela Universidade Federal de Pernambuco; Professor de Direito Civil, na PUC-Goiás (1976-1984) e de Direito Civil e Direito Agrário (Faculdade de Direito da Universidade Federal de Goiás /UFG (1980-2009). Advogado do Banco do Brasil (1968-1990). Diretor da Faculdade de Direito da UFG (2003-2005) e Vice-Reitor da UFG (2006-2010). Autor de livros jurídicos e não jurídicos (15) e de artigos científicos em revistas especializadas. Conferencista e palestrante em congressos, seminários e simpósios. Tem outorgas de títulos de “Cidadão Pedreirense” (1974), “Cidadão Goiano” (2007) e “Cidadão Goianiense” (1996), além de dezenas de medalhas de honra ao mérito. Pertence ao Quadro de Acadêmico-Fundador da Academia Buritiense de Artes, Letras e Ciências – ABALC, onde ocupa a Cadeira nº6, que tem como Patrono Plínio Ferreira Marques. Colabora com artigos e crônicas para o “Correio Buritiense”.


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