MENSALÃO TUCANO X PETISTA
A UM PASSO DA IMPUNIDADE: o Supremo Tribunal Federal,
mais alto patamar do poder judiciário no país, decidiu na última quinta-feira (27)
que o ex-deputado federal Eduardo Azeredo (PSDB) deverá ser julgado em primeira
instância pela justiça federal de minas gerais. DETALHES: ele é processado por
peculato e lavagem de dinheiro no esquema que ficou conhecido como MENSALÃO
TUCANO, OCORRIDO EM 1998, SENDO A MATRIZ DO ESQUEMA DE CAIXA DOIS PETISTA
REVELADO EM 2005. Azeredo renunciou ao seu mandato e, assim, o STF entendeu que
ele perdeu o direito ao foro privilegiado.
AO
REMETER O CASO PARA A JUSTIÇA DE MINAS, O STF JULGOU DE ACORDO COM A
REGRA E NÃO COM A EXCEÇÃO, COMO FOI FEITO EM RELAÇÃO A ALGUNS RÉUS DO
MENSALÃO DO PT. COM DECISÃO, FICOU UM POUQUINHO MAIS
FÁCIL RECONHECER UM FATO QUE JÁ É RECONHECIDO POR UM NÚMERO CRESCENTE DE
ESTUDIOSOS, DE QUE A AP 470 (“MENSALÃO DO PT”) FOI RESOLVIDA COMO UM JULGAMENTO
DE EXCEÇÃO.
*Por
Paulo Moreira Leite
Ao decidir, por 8 votos a 1, que
Eduardo Azeredo deve ser julgado em Minas Gerais pelas denúncias ligadas ao
mensalão tucano, o Supremo fez a opção correta entre a farsa e a justiça.
A farsa, como se sabe, consistia em
negar a Azeredo o direito de ser julgado em primeira instancia – e depois pedir
um segundo julgamento em caso de condenação, como a lei assegura a todo cidadão
sem prerrogativa de foro – apenas para manter um teatrinho coerente com a AP
470.
Eduardo Azeredo teve seu direito
reconhecido pacificamente, por 8 votos 1, placar tão folgado que desta vez não
se ouvirá o coralzinho de quem culpa os “dois ministros da Dilma” por qualquer resultado
que não lhe agrada.
Em nome da mitologia em torno do
“maior julgamento da história” se poderia querer repetir uma injustiça por toda
a história.
Assim: já que nenhum réu ligado
ao PT teve direito a um julgamento em primeira instância, o que permite a todo
condenado entrar com um recurso para obter um segundo julgamento, era preciso
dar o mesmo tratamento a pelo menos um dos réus ligados ao PSDB.
Para esconder um erro, era
preciso cometer um segundo – quando todo mundo sabe que isso não produz um
acerto, mas apenas dois erros.
Com decisão de ontem ficou um
pouquinho mais fácil reconhecer um fato que já é reconhecido por um número
crescente de estudiosos, de que a AP 470 foi resolvida como um julgamento de
exceção.
Nas fases iniciais das duas ações
penais, não custa lembrar, o STF deu sentenças diferentes para situações
iguais, o que sempre pareceu escandaloso.
Desmembrou o julgamento dos tucanos.
Apenas réus com mandato parlamentar – Azeredo e o senador Clésio Andrade –
ficaram no Supremo.
O mesmo tribunal, no entanto, fez
o contrário na AP 470. Todos – parlamentares ou não -- foram julgados num
processo único, num tribunal único.
Mesmo quem não tinha mandato parlamentar
foi mantido no STF, onde as decisões não têm direito a recurso e, apenas em
casos muito especiais, é possível, entrar com os embargos infringentes.
Mesmo assim, na AP 470 havia até o
risco, como se viu, de negar embargos, não é mesmo?
Ao decidir que o ex-deputado
mineiro deve ser julgado nas regras que a Constituição e a jurisprudência sempre
asseguraram a todos os réus em situação semelhante – a única exceção foi o
notório Natan Donadon, com várias particularidades – o STF coloca
outro debate em questão.
Se Eduardo Azeredo terá direito –
corretamente -- a um segundo julgamento, caso venha a ser condenado, por que os
réus da AP 470 não podem fazer o mesmo?
Essa é a pergunta, desde ontem.
Se os réus da AP 470 não tiveram direito a um novo julgamento -- seja através
de uma revisão criminal, seja na Corte Interamericana de Direitos Humanos --
teremos a confirmação da farsa dentro da farsa, a exceção dentro da exceção.
Tudo para os amigos, nem a lei para os adversários.
*Diretor da Sucursal
da ISTOÉ em Brasília, é autor de "A Outra História do Mensalão". Foi
correspondente em Paris e Washington e ocupou postos de direção na VEJA e na
Época. Também escreveu "A Mulher que Era o General da Casa".
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