Coluna MEMÓRIAS E VIVÊNCIAS - A MÃE DE JOSÉ FURTADO

  *Por Francisco Carlos Machado

A MÃE DE JOSÉ FURTADO 

Em novembro de 2003, no topo do morro em Coelho Neto, onde funcionava o Hospital lvan Rui, na capela do mesmo, em cima do mármore frio, jazia o corpo também frio do amigo José Furtado de Araújo, falecido poucas horas antes de fulminante ataque cardíaco. Assim, como eu, os presentes esperavam sua mãe e demais irmãos vindos de Teresina chegarem, para logo em seguida viajarmos para o município vizinho, onde seria velado o corpo do jovem líder político de 36 anos, na sua casa, na fazenda Ana Maria. Ao chegar o carro com a mãe de Furtado, Rosemary Lima de Araújo, a vi descer do carro, caminhar etéreo para dentro da capela, e, quando a mesma viu o corpo de seu filho primogênito, àquele no qual ela tanto amava, seu corpo e braços, em choro, envolve o corpo do  primogênito, ecoando do profundo de seu ser  um lamento que diz tudo sobre ela:

 - Senhor, que provação! Senhor, que provação!

Enquanto se ouvia tal lamento, em lágrimas, questionador ao Senhor da vida, devido Ele ter retirado o filho companheiro dela, Rosemary de Araújo, afirmava que a cruz da vida dela a partir de então, teria um peso maior. Eu, um crente no mesmo Deus dela, ao ouvir tal frase, chorava e também no meu interior, dizia ao Senhor: Por que fizestes isso?

Fiz o discurso fúnebre de Furtado, filho de Rosemary antes dele voltar a mãe terra e se tornar pó, assim, como fiz o discurso de um ano, em memória do filho de Rosemary. Dentre as mãe das famílias influentes do meu torrão natal, cultivava na convivência e encontros com ela na Ana Maria, em São Luís, e, em Teresina, sincero respeito e admiração.

Voz calma, pulso firme, espiritualidade sentida, uma devota de São Francisco, guardo com carinho um diálogo mantido com ela, certa manhã em Teresina, quando morava no bairro São Cristóvão, onde ela vó, depois de ter lutado pela formação superior dos filhos, zelava neste período pela educação dos netos crianças e adolescentes. Neste diálogo, em 2006, dizia lhe que agora dedicaria minha vida a missões religiosas, iria para o seminário, talvez, me doaria à África.

- “Eu pensei em ser freira”, me disse. Dentre tantas falas espiritualistas e solenes naquela manhã, ouvimos a comovente canção de Padre Zezinho, “Um jovem Galileu”. Ela, voz sempre serena, pacífica, me confidenciou que “Um jovem Galileu”, a ajudou muito a se erguer da perda do filho. “Quando meus filhos eram crianças, cantávamos essa música em casa. Furtado a amava”.  Eu sabia disso, pois seu filho primogênito, era um cristão católico verdadeiro. Este, após a perda do pai José, em 1978, ainda adolescente, quando a mãe queria ler algo na noite para os filhos, sugeria: - Mamãe, vamos ler a Bíblia.

Dona Rosemary Araújo, gostava de uma boa leitura. Incutia o hábito aos filhos e aos seus alunos. Foi devota educadora para os meninos da Ana Maria e para os filhos e netos.

Em 2008, após nossa vitória política ao grupo rival do médico Burlamaque, dela apenas ouvia: “até o Império Romano caiu. Nesta vida tudo se acaba”. Sem mágoa, dela, anos antes, ouvi que nunca deixava de falar com ele se o visse. Ela sabia separa o ser humano do adversário político. Não chegou ao patamar de santa, mas nisto, me deixou o exemplo da necessidade de obedecer ao mandamento do perdão.

Por razões pessoais e morais, decidi não querer mais me relacionar politicamente com alguns filhos políticos de dona Rosemary Araújo, ainda vivos, desejam eternidade em poder temporal. Tais, por minha postura e escrever duro referente exigir honestidade com as coisas públicas, possuem mágoa de mim. Conversei, depois de bons tempos, com um que almejava status quo  político de qualquer forma, que não era contra a família deles, me opunha na política eles abraçarem o sistema da corrupção. Afirmei gostar muito da mãe deles. O mesmo disse que mentia. O que fez energicamente afirmar que sim, não tinha razão para fingir sentimentos.

Em 2009, em Praça Pública, dando palestra no dia das mulheres, estando Rosemary Araújo presente, afirmei ser ela um exemplo de mulher e de mãe para nossa comunidade. Continuo com o mesmo pensar. Assim, se não estivesse tão longe, iria velar seu corpo, chorar com os que choram; lamentar, com os que lamentam, a sua partida.

Realmente distante, em Mission Dei entre indígenas, ao saber de seu retorno em espírito para seu Deus, senti não a dor do lamento, mas a dor de não ter podido conversar mais com essa nobre mulher.

Então, dentro de uma  rede,   em uma casa familiar de índios, alentado  imaginei  o quanto foi belo  o retorno de  Dona Rosemary Araújo junto a Deus, da grande emoção   de lá sentir  o primeiro abraço eterno  de seu filho José Furtado, privilegiado de receber sua querida mãe na morada eterna dos que na vida terrena  amam a Deus.


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