A visão paranoica de quem assim o considera.
O “ENERGÚMENO”
EDUCADOR PAULO FREIRE
*Por Benedito
Ferreira Marques
Há poucos dias, canais de televisão e noticiários
radiofônicos destacaram uma entrevista a jornalistas, em que uma autoridade de um dos Poderes da República do Brasil - conhecida por seus impropérios quase diários -,
qualificara uma das maiores expressões da educação
no século passado, no Brasil e no mundo, como energúmeno. Sim,
energúmeno! Eu vi e ouvi na televisão. Como o autor da asneira indagara aos
jornalistas “se era isso mesmo” (?!), passou a impressão de que ele não sabia o
significado da palavra e a pronunciara de impulso. Imagino que muitas pessoas
se socorreram do dicionário, em seus celulares ou tablets em mãos, pois “rei não erra”, no dizer do vulgo. Deixo de
mencionar o nome da autoridade, por duas razões simples: uma, não quero
contribuir com os desígnios midiáticos de quem quer que seja; e duas, são quase
diárias as aleivosias protagonizadas pelo referido senhor, e nada acontece.
Medo, covardia ou conveniência? Não me
enquadro em nenhuma dessas hipóteses. Prefiro o brado, ainda que não seja
“retumbante”!
O que dizem os dicionários:
Energúmeno - s.m. - obsoleto (a), obsolescente; possuído pelo demônio;
possesso; pessoa exaltada; desequilibrada ou por paixão, obsessão; desatinado. Também
é sinônimo de imbecil que, à sua vez, significa “aquele que possui pouco juízo,
idiota, tolo”.
Nossa! O pernambucano
(nordestino, claro!) Paulo Freire
fui tudo isso?
Não se sabe em que situação o
renomado mestre foi enquadrado dentro desses conceitos. Infere-se, contudo, que
a intenção não era elogiar aquele que, na visão paranoica do prolator, era
“comunista”, “esquerdista”. Na atual conjuntura política brasileira quem não
concordar com a ideologia do “Poder Central” está simplesmente fodido, ou mesmo
sujeito a ataques homofóbicos, como aconteceu recentemente com um jornalista.
Sai de perto, pois “comunista come criancinhas incautas”. Deus nos livre e
guarde! Essa ojeriza ao comunismo e ao esquerdismo (antes, era
“lulopetismo”) parece patológico! Nem na China há comunismo puro, do jeito que
imaginam aqui. Parece que voltamos a 1964!!
Não tenho mandato formalizado
(procuração) de nenhum educador, muito menos dos familiares
do sempre considerado Mestre Paulo Freire, para produzir a defesa
do “educador”, em cuja categoria me incluo, sem nunca ter sido comunista;
sequer me filiei a qualquer partido político - de esquerda, de direita ou do
centro. Sempre pensei independente e não me arrependo disso. Bem por essa única
razão, resolvi bradar aos quatro
cantos, ainda que possa causar desgosto aos que pensam em sentido contrário e
comungam da extravagante avaliação, ora repulsada, sobree a figura de PAULO FREIRE.
PAULO FREIRE foi um educador de que o
Brasil se orgulhou e continua se orgulhando, por sua expressão intelectual que
ultrapassou fronteiras, por sua inteligência, criatividade, talento e valor, a
cujos pés nem a maior autoridade do País pode chegar. Bastaria que se
registrasse o prêmio de “Patrono da Educação Brasileira”,
conferido pelo Congresso Nacional. Um título que reuniu todas as suas virtudes
de educador,
com projeção internacional. Inventor do método de alfabetização em 45 dias, seu
nome ganhou o mundo, ao ponto de merecer nada menos do que 35 títulos de
“Professor Honoris Causa” de diversas
Universidades em vários países. E não era para menos, depois de ter sido
“Professor Visitante” da famosa Universidade de Harvard (EUA). Tem até estátua
entronizada na Suécia, ao lado de Pablo
Neruda e Angela Davis. No Brasil,
também foi professor da PUC-São Paulo e da UNICAMP-SP. Um homem dessa envergadura não pode ser
sinônimo de “imbecil” ou “idiota”.
Talvez a
repugnância do detrator de Paulo Freire,
revelada na malsinada entrevista que inspira esta narrativa, tenha explicação
no consagrado livro “Pedagogia dos
Oprimidos”, e por ter sido Secretário de Educação no Governo Municipal de
Luíza Erundina, na maior Capital do
Brasil (São Paulo) (1989-1991). Nada justificaria a indigesta e fétida
verborreia de que se ocupou a mídia. Nenhum educador, principalmente os que
prestaram e continuam prestando relevantes e penosos serviços
nas mais longínquas paragens do interland
brasileiro, principalmente no sofrido Nordeste (como Buriti-MA, minha terra
natal), pode ter gostado do destempero verbal de quem devia tratar a EDUCAÇÃO como
prioridade e respeito em nosso País, que permanece com elevado índice de
analfabetos, ainda. Respeitar quem carrega a cruz da tarefa de alfabetizar nas
costas com salários para além de indignos seria o mínimo. A política educacional
que se desenvolve, no Brasil de hoje, revela-se tão vergonhosa, vexatória,
confusa e polêmica que, em um ano, o MEC já teve dois Ministros e já se fala na
saída do segundo.
Destarte, o achincalhe desferido
contra PAULO FREIRE expõe a pequenez
da autoridade, em deboches repetidos, para o gáudio de uma claque rude que se
deleita em risadas orgásticas.
Episódios como esses de que aqui
trato me conduzem aos anos 60 do século passado, quando cursava Direito, na
antiga Faculdade de Direito de São Luís (MA), na Rua do Sol. O saudoso
Professor de Medicina Legal,
Professor Pedro Neiva de Santana,
explicava o significado de paranoia, enquanto transtorno
mental. Dizia que, tecnicamente, a paranoia se tratava de “um instinto ou processo de
pensamento que se acredita ser fortemente influenciado
pela ansiedade ou
medo, muitas vezes ao ponto de delírio ou irracionalidade. O pensamento
paranoico geralmente consiste na crença
de que a pessoa a ser alvo de perseguição ou de uma conspiração”. Aquele saudoso mestre gostava de dar exemplos
com posturas dos políticos da época, e o fazia com uma
didática de fácil compreensão, porque seus “causos” eram contados com fina e
gostosa ironia. Incitava os alunos a se lembrarem de fatos similares. Um
colega, que acompanhava de perto as diabruras políticas daqueles tempos, contou
um caso que se tornara antológico: Um certo deputado estadual, considerado um
grande orador, a babar pelos cantos da boca quando discursava, tamanha era a
sua eloquência. Certa vez, quando ocupava a tribuna, fez uma pausa e,
dirigindo-se ao Presidente da Mesa, exclamou: “Senhor
Presidente, parece que estou a ouvir latidos de um cão nas fileiras finais das bancadas
ali atrás!!! Era um deputado da
oposição, também famoso por sua oratória e por suas ironias e perspicácia, que não
prestava a atenção devida ao discurso do seu colega parlamentar; ao invés, comandava
um animado “bate-papo” com outros deputados em sua volta. Então este
espirituoso deputado virou-se para o orador da tribuna e respondeu-lhe, de
bate-pronto: “Engana-se Vossa Excelência; Vossa Excelência está ouvindo o eco de sua
própria voz”. Os risos foram inevitáveis na sala de aula, que logo
acabou.
Talvez essa hilariante passagem da
vida política maranhense se preste para comparar com o episódio ora narrado,
guardadas as suas devidas circunstâncias.
Se a sistemática repugnância
manifestada contra os que, por ações
transformadoras, são tatuadas com a palavra energúmenos, então se pode dizer que
“estão ouvindo o eco de suas próprias vozes”.
SOBRE O AUTOR
BENEDITO FERREIRA MARQUES nasceu no dia 11 de novembro de 1939, no povoado Barro Branco, no município de Buriti/MA. Começou seus estudos em escola pública e, com dedicação, foi galgando os degraus que o levariam à universidade. Possui graduação em Direito pela Universidade Federal do Maranhão (1964), especialista em Direito Civil, Direito Agrário e Direito Comercial; mestre em Direito Agrário pela Universidade Federal de Goiás (1988); e doutor em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (2004). Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Comercial, atuando principalmente nos seguintes temas: direito agrário, reforma agrária, função social, contratos agrários e princípios constitucionais. NA Universidade Federal de Goiás, foi Vice-reitor, Coordenador do Curso de Mestrado em Direito Agrário e Diretor da Faculdade de Direito. Na Carreira de magistério, foi professor de Português no Ensino Médio; no Ensino Superior foi professor de Direito Civil, Direito Agrário e Direito Comercial, sendo que, de 1976 a 1984, foi professor de Direito Civil na PUC de Goiás. Acompanhou pesquisas, participou de inúmeras bancas examinadoras de mestrado, autor de muitos artigos, textos em jornais, trabalhos publicados em anais de congressos, além de já ter publicado 12 livros, entre eles “A Guerra da Balaiada, à luz do direito”, “Marcas do Passado”, “Direito Agrário para Concursos”; e “Cambica de Buriti”; entre outros.
já abusou
ResponderExcluirMuito bom a coluna..lamentavelmente a situacao do lider politico brasileiro a educacao tem que ser vista como prioridade em um país que cresce os analfabetos intelectual
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